Moedas de Afonso Henriques

Moedas cunhadas desde D.Afonso I até D.Pedro P.Regente
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josix
Reinado D.Pedro IV
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Re:

#81 Mensagem por josix » domingo out 29, 2023 4:18 pm

MCarvalho Escreveu:
sábado mar 19, 2005 3:25 pm
Cara Ana,

como sabe, este é um assunto muito polémico. Recordo-me que já tinha sido aflorado no nosso antigo fórum (http://pub26.ezboard.com/bnumismaticapt)

Sei que conhece os autores, portanto estará ciente que a primeira pessoa a atribuir a cunhagem de moeda de ouro a D. Afonso Henriques foi Teixeira de Aragão, por volta de 1867, aquando da Exposição de Paris.

Cá estão elas:

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Na época de Aragão, esta posição já foi bastante polémica, pois as moedas (que até eram descobertas recentes) foram atribuidas a Afonso II, e não Afonso I.

Os argumentos de Aragão foram posteriormente defendidos por ele em 1875, na célebre Descrição. Eram os seguintes:

Das duas variantes conhecidas na época do dito morabitino alfonsi, uma apresenta um B no reverso, no último quadrante dos escudetes. Esta letra ou marca monetária foi identificada como referente a Braga, assim, Aragão concluiu que a moeda fora cunhada em Braga, seguramente depois de 1128, altura em que, supostamente, Afonso Henriques terá atribuído o privilégio de cunhagem de ouro ao bispo de Braga.

Aragão não identifica, contudo, o documento onde supostamente se atribui esse privilégio. Neste momento também não tenho o documento para o poder citar, mas uma das críticas que li há tempos, é que o documento é um pouco polémico, pois as novas leituras interpretam que o que Afonso Henriques atribui ao cabido de Braga é o privilégio de colectar impostos (e recolher ouro) e não de cunhar moeda...

O segundo argumento de Aragão passa pelas legendas desses morabitinos:

REGIS PORTVGALENSIVM
MONETA . DOMINI . I . AFSI

e

REGIS PORTVGALEMSM
MONETA DOMINI ALFONSI

De acordo com Aragão, significaria "moeda do rei Afonso I, ou de Afonso Infante (Infans

Esta leitura é muio frágil, mesmo a Academia Real das Ciências, logo em 1876, no parecer que fez do trabalho de Aragão, faz um comentário discreto ao autor, indicando-lhe que no século XII não havia ainda o uso dos numerais na titulatura dos reis, nem Afonso Henriques jamais assinara como Afonso I (por não ser uso na época, como vimos, e porque, digo eu, ele não faria ideia que depois dele haveria outros Afonsos ;)).

Em todo o caso, a segunda leitura, de I de Infans poderia ser válida, pois sabe-se que Afonso Henrique assinou por vezes assim, aliás, foi o único rei de Portugal a assinar com infante.

Posto isto, Aragão manteve a sua posição, considerando a moeda como de Afonso Henriques.

Os numismatas que se lhe seguiram, já questionaram esta posição.
Neste momento não sei se Batalha Reis seguiu Aragão, mas o estudioso mais importante depois de Aragão, Ferraro Vaz, questionou esta posição e atribuiu as moedas a Afonso II, inspirado em argumentos referentes à tipologia da moeda, como sendo própria do século XIII e, mais importante, apresentando elementos heráldicos que não parece terem sido usados por Afonso Henriques, como as quinas com besantes. Muito menos numa altura próxima de 1128...

Ferraro Vaz alerta também para o facto do tipo de ouro nestas moedas ser suspeito, dando a entender que há hipótese da moeda ser uma falsificação.

Ainda na análise tipológica, a minha opinão pessoal é a seguinte:

-O estandarte de Afonso Henriques conhecido até ao século XVI era o que estava no escudo no túmulo em Coimbra, era um escudo metálico com umas tiras de couro azul, dispostas em cruz e pregadas ao escudo com pregos. Infelizmente esse escudo já não existe (D. Sebastião levou-o para Alcácer Quibir e lá ficou), mas a tradição atribuia esse estandarte (a cruz azul) a Afonso Henriques, mas só depois do fossado de Ourique, em 1139, nunca por volta de 1128, ano em que supostamente se atribuiu o privilégio de cunhagem a Braga.

As quinas serão uma introdução de D. Sancho I (sendo que os besantes por vezes são identificados como originalmente sendo os buracos dos pregos na cruz de couro do escudo de Afonso Henriques, só mais tarde é que veio a ideia das 30 moedas de Judas e tudo o resto que hoje lêmos nos manuais).

Assim, pelo aspecto da moeda, sou obrigado a inclinar-me mais para Ferraro Vaz e atribuir a moeda a Afonso II.

Alberto Gomes, em 1991 mantem estas moedas na numária de Afonso II, mas continua a alertar que novos estudos (que não )são referidos, mas penso que sejam os de Mário Gomes Marques confirmam que a liga de ouro destes morabitinos não encaixa nas leis de Afonso II.

Depois da morte de Alberto Gomes, a Associação Numismática de Portugal adquiriu os direitos do trabalho deste autor, e nas recentes edições do seu livro (Moedas Portuguesas...), o morabitino com o B (apenas esse, o da cruz não), regressa ao reinado de Afonso Henriques, com o argumento que o tipo de metal não poderia nunca ter sido cunhado no tempo de Afonso II, portanto só poderia ser de Afonso Henriques.

Resumindo:

Estas moedas são polémicas: a tipologia não encaixa na heráldica de Afonso Henriques, a leitura das legendas é um pouco forçada, o privilégio de Braga (lá por causa do B) cunhar moeda é suspeito, o metal parece que veio doutro tempo que não é o século XIII nem deve ser o século XII, e concluindo, só se "descobriu" a moeda com o B em meados do século XIX.

A minha opinião é a seguinte: eu nunca vi nenhuma dessas moedas, nunca pude comparar e estudá-las, mas por tudo o que tenho lido, e por tudo o que vou sabendo sobre a situação económica-monetária do reinado de Afonso Henriques, pelo que conheço da sua heráldica, penso que a emissão de ouro, com aquelas características, por alturas de 1128 e década de 1130 parece-me pouco provável.

Também sei, e sabemos todos, que nos finais do século XVIII até quase ao século XX, houve uma autêntica indústria de falsificação de moeda de ouro antiga. Muito particularmente de trientes visigóticos e outras moedas medievais em ouro.
Como há muitos desses trientes falsos, e a tipologia dessas moedas, sejamos francos, é muito tosca, não muito diferente das características desses morabitinos, sinto que há motivos para suspeitar da sua autenticidade. Mas é só uma suspeita... o que eu queria mesmo é comparar a liga de ouro dos ditos morabitinos alfonsis com um triente falso, e ver se há relação.


O problema é que estas moedas são raras, para as vermos temos que entrar em contacto com os proprietários, e depois não é simpático dizer que afinal, a moeda tão rara e bonita que tem, pode ser afinal uma falsificação do século XIX...

(este últimos parágrafo não fui eu que disse :megacool: )

PS - Ana, há muito mais para dizer sobre o tema do que isto que referi, todas as afirmações que disse devem ser confirmadas pela Ana, isto é um fórum, eu estou a escrever ao sabor da pena e não tenho paciência para fazer as referências bibliográficas e documentais todas que sustentem as minhas afirmações, esse é um trabalho que deverá ser feito por si, embora, se desejar, poderei ajudar, tem é que me dizer que pontos do meu texto quer ver mais desenvolvidos.
Estarei a reabrir aqui um tema antigo, mas estou curioso acerca do morabitino antribuído ao D. Afonso Henriques.

Os argumentos do Teixeira de Aragão para mim fazem sentido. Posso estar a ser parcial por os ter acabado de ler agora :D quero dizer que ainda não conheço os contra-armentos posteriores.

Ele encontrou o morabitino com a legenda 'MONETA DOMINI I AFNSI', 'REGIS PORTVGALENSIUM' pela primeira vez quando catalogava a colecção de Ferreira Carmo. Na altura era considerado único e não parece ter passado pela cabeça dele ou de outros que fosse de Afonso II. Parece-me que a imbirração de que tinha que ser de Afonso II é que tem que ser muito bem justificada.

Para mim uma coisa está mal explicada na classificação actual dos morabitinos iniciais. As legendas. Porque é que Afonso II havia de usar 'domini alfonsi' depois de Sancho seu pai ter já usado 'rex' como titulo? E quando Afonso II usou 'rex' em todas as outras legendas dele?
Se Afonso II estava a copiar um tipo anterior, então haviam morabitinos de Afonso I com a legenda 'domini'. Só se copia algo que já existe.

Quanto a se era verdadeiro ou falso, alguém sabe o percurso posterior do primeiro morabitino atribuído por Teixeira de Aragão a Afonso Henriques? É uma daquelas a que mais tarde fizeram análises ao metal?
O catlálogo do Albergo Gomes actual fala de 3 exemplares conhecidos, 2 dados como falsos. O primeiro documentado é um dos agora dados como falsos, ou é o considerado em dúvida?



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