O CARIMBO GERAL

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numismatica_bentes
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O CARIMBO GERAL

#1 Mensagem por numismatica_bentes » terça jan 01, 2013 6:45 pm

Quais os reais motivos que levaram o Império a criar a contramarca ?

O CARIMBO GERAL foi determinado pela Lei 54 de 6 de outubro de 1835, regulamentada por Decreto de 4 de novembro do mesmo ano. A desvalorização foi de 50% para as moedas nacionais (Rio de Janeiro e Bahia) e de 75% para as provinciais ou regionais (Cuiabá, Goiás, Minas Gerais e São Paulo).

São contramarcas com os números 40 - 20 - 10, em algarismos arábicos dentro de um círculo com linhas horizontais (na Heráldica, representa a cor azul). Os diâmetros são 13,5mm; 12mm e 10mm, respectivamente. Eram aplicados no anverso das moedas de cobre (existem alguns erros, com aplicação no reverso) sobre o valor original, de tal forma que fosse capaz de cancelá-lo.

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Durante muito tempo, no meio numismático, acreditava-se que o Carimbo Geral havia sido criado, única e exclusivamente, para desvalorizar as moedas, reduzindo seu valor extrínseco. Na verdade, como veremos a seguir, tratou-se de uma medida necessária à homogeneização do sistema de cobre. Não tinha por objetivo a simples redução do valor extrínseco da moeda, mas sim de ajustar seu valor ao seu peso, ao seu valor intrínseco, nacionalizando a moeda, e dando combate à contrafação. Vejamos:


MOEDAS DE MESMO PESO DEVEM TER O MESMO VALOR

Esclarecimentos:

Seu objetivo principal foi o de homogeneizar o sistema de cobre, facilitando sua aceitação em todo Império.

Não se trata de uma questão de valor extrínseco como se pode constatar na interpretação dada pela maioria dos catálogos e de alguns estudiosos do assunto, e sim de valor intrínseco (peso de cobre contido no disco). O carimbo geral veio não só para homogeneizar o padrão das moedas em circulação, mas também para acabar com a “farra dos carimbos regionais”.

Hoje, o nosso dinheiro não se encontra mais vinculado à quantidade de metal. A moeda fiduciária é um dinheiro sem lastro. Naquela época, era diferente: Possuir uma moeda de ouro com o valor estampado 4000 réis, era o mesmo que dizer que o ouro ali contido correspondia a esse valor.

O cobre era moeda muito usada no Brasil. Porém, paradoxalmente, o país não possuía minas notáveis desse metal, devendo importá-lo do exterior, o que custava caro aos cofres da Coroa. Para as cunhagens das moedas de cobre, foram fabricados discos de diversos pesos e tamanhos (8 oitavas, 4 oitavas, 2 oitavas, etc).

Os discos de 8 oitavas (28,68 gramas), eram destinados às cunhagens dos 80 réis, na Bahia e no Rio de Janeiro, enquanto os de 4 oitavas (14,34 gramas) serviam à cunhagem das moedas de 40 réis, e assim por diante. Atenção! Isso na Bahia e no Rio de Janeiro.

Acontece que havia necessidade dessa moeda nas Províncias distantes, tais como Goiás e Cuiabá. Com pouco cobre à disposição, resolveram não enviar os discos de 8 oitavas, enviando apenas os de 4 oitavas para baixo, ordenando que fossem cunhadas moedas de padrão fraco. Assim, cunharam os 80 réis de Goías, São Paulo e Cuiabá em discos de 4 oitavas (14,34 gramas), ou seja, o mesmo disco em que eram cunhadas as moedas de 40 réis no Rio e na Bahia.

O carimbo geral foi criado para acabar com toda essa confusão. A oitava de cobre (3,5856 gramas) foi cotada à razão de $5 réis e o processo teve início. A moeda que pesasse 28,68 gramas (8 oitavas) deveria valer 40 réis (8 x $5 = $40 réis), com os submúltiplos seguindo a mesma lógica. Devemos raciocinar dessa forma:

“Não carimbavam as MOEDAS de acordo com seu valor facial! Carimbavam os DISCOS de acordo com o seu peso.”

É simples constatar que a “ordem” era a de que o carimbo geral “sumisse” com o valor facial antigo, sendo aplicado bem no centro do anverso, sobre o valor. Podemos observá-las e verificar que o valor anterior desapareceu sob o carimbo...são poucas as contramarcas desse tipo aplicadas de forma excêntrica.


O 75 réis e o 37 1/2 réis.

O 75 réis de Minas era cunhado no mesmo disco das moedas de 40 réis da Bahia e do Rio (peso: 14,34 gramas e diâmetro: 35 mm); e o 37 1/2 réis, em discos de 20 réis dessas mesmas Casas (peso: 7,17 gramas e diâmetro 30 mm).

Ao carimbar, por exemplo, uma moeda de 75 réis, não era o seu valor extrínseco a ser considerado e sim o seu DISCO, o seu peso (valor intrínseco) de 14,34 gramas - correspondente a 4 oitavas de cobre, à razão de $5 réis por oitava - que era o mesmo peso de uma moeda de 40 réis da Bahia ou do Rio que receberam o carimbo geral de 20.
Devemos considerar que suas dimensões (peso e diâmetro) são as mesmas da moeda de 40 réis cunhada na Bahia e no Rio de Janeiro, portanto sendo correta a aplicação do carimbo geral de 20 réis.

Não se tratava de reduzir as moedas à metade ou à quarta parte e sim colocar os discos compatíveis com o seu peso em oitavas, à razão de $5 réis/oitava.

Sobre o 75 réis: Não se tratava de reduzir o valor 75 à sua quarta parte e sim uniformizar peso com valor compatível. Raciocínio análogo deve ser aplicado ao 37 1/2 réis.


As moedas de 20 e 40 réis de Goiás.

Tanto as moedas de 20 réis, quanto as de 40 réis de Goiás, foram cunhadas no mesmo disco daquelas de 20 réis do Rio e da Bahia.

É por isso que existem moedas de cobre de 20 réis e 40 réis de Goiás, ambas com carimbo geral de 10. Não são um erro ! o carimbo foi aplicado de acordo com seu peso (2 oitavas de cobre)

Mesma Província, mesmo disco, com mesmo peso (2 oitavas - 7,17 gramas), mas com valores diferentes (20 e 40 réis). Como deveriam ser reduzidas ao valor de $5 réis por oitava de peso, todas receberam, independente do seu valor facial, o carimbo geral de 10.

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Figura: À esquerda, 40 réis 1832 R, cunhado na Casa da Moeda do Rio de Janeiro (peso: 14,34 gramas). À direita, 80 réis 1833 G, cunhado na Casa de Fundição de Goiás, em disco de mesmo peso da moeda à esquerda. Dois valores diferentes cunhados sobre o mesmo disco (padrões forte e fraco). A primeira moeda podia circular em todo território nacional. A segunda era de circulação restrita à Província de Goiás.


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Figura: Aqui temos as mesmas moedas (mesmo tipo) com o carimbo geral de 20 aplicado ao centro, cancelando o valor anterior. À esquerda, 40 réis 1832 R, cunhado na Casa da Moeda do Rio de Janeiro (peso: 14,34 gramas), agora reduzido à metade do seu valor (20 réis), com a aplicação do carimbo geral.
À direita, 80 réis 1833 G, cunhado na Casa de Fundição de Goiás, em disco de mesmo peso da moeda à esquerda, dessa forma recebendo o mesmo carimbo que uniformizava as duas pelo seu peso, à razão de $5 réis a oitava. Como o peso de 14,34 gramas correspondia à 4 oitavas, ambas passaram a valer 20 réis.

Com o exemplo acima fica bem claro que o objetivo do carimbo geral era o de uniformizar o sistema de cobre, baseando-se no peso das moedas e não no seu valor extrínseco como alguns acreditam. Dessa forma, fica esclarecido de uma vez por todas a aplicação do carimbo geral de 20 sobre as moedas de 75 réis e o carimbo geral de 10 sobre o “vintém de ouro” (37 1/2 réis). Ao contrário do que se pensava, a aplicação foi correta, pois se baseava apenas no peso do disco em que estas moedas haviam sido cunhadas em sua origem.


Nota: Sobre o valor $5 réis por oitava, não se trata propriamente do “preço” da oitava de cobre. Trata-se de um parâmetro para homogeneizar as moedas. Dizer que o padrão da carimbagem seria feito à razão de $5 réis a oitava, não significa, necessariamente, que a oitava do cobre custasse exatamente $5 réis, e sim que o preço médio, praticado durante um certo período de tempo, girasse em torno disso. Sabe-se que o preço do arrátel de cobre variava, segundo o tipo de cobre (em barra, disco, in natura, etc), de $360 a $500.
Em algumas Províncias, as moedas circulavam à razão de 10 réis a oitava, em outras, à razão de 20 réis, e em outras tantas, à razão de 18 réis. O carimbo geral homogeneizou tudo, dando a todas elas caráter de moeda nacional, associando às moedas de mesmo peso, um mesmo valor. Terminava assim a restrição às moedas provinciais (como por exemplo as de moeda de Goiás) que passavam a ser nacionais, aceitas em todo Império.



rodrigoleite
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Re: O CARIMBO GERAL

#2 Mensagem por rodrigoleite » terça jan 01, 2013 8:28 pm

Bela explicação!

Creio que mereça ficar em inamovível!
Rodrigo Leite

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Rodolfo Rossi
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Re: O CARIMBO GERAL

#3 Mensagem por Rodolfo Rossi » quarta jan 02, 2013 2:05 am

rodrigoleite Escreveu:Bela explicação!

Creio que mereça ficar em inamovível!
Concordo com o Rodrigo, um belo material

Parabéns :green:
O passado não reconhece o seu lugar. Está sempre presente.

Visite meu facebook http://www.facebook.com/numismatica.monarquia

Att. Rodolfo Rossi.

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Zé Cardoso
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Re: O CARIMBO GERAL

#4 Mensagem por Zé Cardoso » quarta jan 02, 2013 1:48 pm

Bom tópico. Um dos assuntos que sempre buscam os
numismatas, principalmente os iniciantes...

tiberius
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Re: O CARIMBO GERAL

#5 Mensagem por tiberius » quarta jan 02, 2013 2:29 pm

Realmente um estudo bem feito.
Agora, tudo parece muito simples e lógico.
Visite minha galeria (em construção).
http://www.forumancientcoins.com/galler ... ?cat=34492

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Re: O CARIMBO GERAL

#6 Mensagem por [Noob Saibot] » sexta mar 15, 2013 1:56 pm

boa explicação, parabéns

JMesquita
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Re: O CARIMBO GERAL

#7 Mensagem por JMesquita » sábado jul 27, 2013 8:21 pm

Obrigado pela aula super esclarecedora sobre os famosos " Carimbos Gerais"!!!

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Leandro Numismata
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Re: O CARIMBO GERAL

#8 Mensagem por Leandro Numismata » quarta ago 21, 2013 8:10 pm

numismatica_bentes Escreveu: São contramarcas com os números 40 - 20 - 10, em algarismos arábicos dentro de um círculo com linhas horizontais (na Heráldica, representa a cor azul).
Tive a oportunidade de ver alguns carimbos gerais sem as linhas horizontais. Geralmente, esses carimbos são identificados pelos proprietários ou vendedores como sendo do Pará.

Nunca concordei com essa identificação, ao mesmo tempo em que desconfiava que existem carimbos gerais sem o fundo linhado. Afirmo isso baseado em observações feitas em algumas moedas cujo algarismo do carimbo era do mesmo estilo do algarismo aplicado no carimbo geral linhado.

Pois bem: hoje, ao receber o catálogo J. Vinicius do Amaral "Moedas do Brasil - cobre e bronze" na página 117 informa que há dois tipos de carimbo geral: o com fundo linhado (conhecido de todos) e o com fundo LISO e com orla de contorno.

O que acham dessas informações?
Compro moedas de cobre brasileiras com carimbo do Pará e do Maranhão.

Leandro Guimarães Ribeiro
Porto Velho - Rondônia, Brasil.

rodrigoleite
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Re: O CARIMBO GERAL

#9 Mensagem por rodrigoleite » quarta ago 21, 2013 8:55 pm

Leandro Numismata Escreveu:Nunca concordei com essa identificação, ao mesmo tempo em que desconfiava que existem carimbos gerais sem o fundo linhado. Afirmo isso baseado em observações feitas em algumas moedas cujo algarismo do carimbo era do mesmo estilo do algarismo aplicado no carimbo geral linhado.
Já na década de 40 Prober dizia que havia 3 tipos de carimbo: Vertical, Diagonal e Liso.

Eu classifico os Carimbos Gerais tipologicamente numa matriz 2x3:

1.1 | 1.2 | 1.3
2.1 | 2.2 | 2.3

1 ou 2 (boa ou má qualidade de gravação); 1, 2 ou 3 (horizontal, diagonal ou liso).

Multiplicando 6 por 3 (tipos de valores), temos 18 variantes possíveis.

Aqui um exemplo: http://numismaticando.blogspot.com.br/2 ... ogica.html
Rodrigo Leite

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Leandro Numismata
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Re: O CARIMBO GERAL

#10 Mensagem por Leandro Numismata » quarta ago 21, 2013 9:09 pm

Olá Rodrigo.

Acessei o teu blog e gostei da classifação.

Como ainda não tive acesso às obras do Prober, desconhecia que ele já havia relatado o carimbo geral de fundo liso. Também nunca reparei que há carimbos gerais vertical e diagonal (é isso mesmo?)

Obrigado por partilhar essas informações. :thumbs:
Compro moedas de cobre brasileiras com carimbo do Pará e do Maranhão.

Leandro Guimarães Ribeiro
Porto Velho - Rondônia, Brasil.

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